HISTÓRIA DA CERÂMICA LEITE

A meados do século XIX, aparecem em S.Miguel Açores, os primeiros engenhos cerâmicos.
Surge então Manuel Leite, natural de Peso da Régua bela localidade, situada na margem direita do Rio Douro. Chegava cheio de planos para grandes empreendimentos. E trazia consigo, um amigo Bernardino da Silva. Assim se funda uma sociedade no Porto dos Carneiros, onde se fabricava louça de barro vermelho. Era ainda uma continuidade da Velha tradição da loiça da Vila. Cativado pela amenidade do clima e beleza da terra presentiu que a Vila da Lagoa, seria o sítio ideal para criar uma industria com condições industriais e de melhor vida.
Precisamente nos fins de Junho de 1872, Manuel Leite Pereira, que se havia desligado da anterior sociedade, funda a sua Fábrica de Cerâmica, nas Alminhas na Lagoa, local onde funciona actualmente a Cerâmica Vieira.

Na Fábrica de Cerâmica Leite, então denominada Fábrica Açoriana, fabricava se louça vidrada por influencia de algumas terras do Norte do País. Esta industria começou por utilizar barro importado da Inglaterra, aproveitando os Veleiros que aqui vinham carregar as nossas tão apreciadas laranjas. Deste modo,barro tão fino permitiu a feitura de artísticas peças de cerâmica entre as quais os celebres pratos comemorativos da visita régia a S.Miguel, assim como outras que fizeram parte de Exposições Nacionais e Internacionais . Repleto de dinamismo e orgulhoso da sua cerâmica, leva as suas peças artísticas para lá do Atlãntico, onde recebeu prémios muito honrosos. Citamos assim: Exposições em 1882,em Ponta Delgada (Esposição de Artes, Ciencias e Letras Micaelenses)1882 no Porto, (Exposição de Cerãmica Portuguesa),em 1883 em Boston,(Art and Industry), em 1884 em Londres (Chrystal Palace Company), em 1888 e 1893 em Lisboa (Exposição Industrial Potuguesa), em 1900 em Paris (Exposição internacional) e em 1901 no Porto (Palácio de Cristal).
Quando o Rei D.Carlos e D.Amélia visitaram os Açores em 1901, realizou-se a 1- Exposição e Feira Franca para mostrar os produtos da ilha. Aí se achava representada esta cerâmica, mostrando -se os produtos desde os mais modestos “á loiça da Fábrica de Manuel Leite Pereira , premiada em todas as Exposições nacionais e internacionais, como aconteceu numa recente feira em Paris. Como cita o jornal”O Lagoense, que se publicava na altura.

Mais tarde com a crise da exportação da laranja, passou- se a importar barro de Santa Maria e do continente, para fabrico de loiça doméstica.Tambem havia barreiros na Ribeira Grande cujo barro se destinava ao fabrico de telha ,canos e condutas de água. Nesta época procedeu- se em toda a ilha de S.Miguel a um grande avanço técnológico.As casas estavam pela primeira vez a ter água encanada para uso doméstico.
Manuel Leite Pereira fixara residencia nesta ilha ,mais propriamente,na vila da Lagoa junto à sua cerâmica,após o seu casamento com a Terceirense Maria de Sousa Adão. Deste casamento teve duas filhas, Virginia e Maria dos Anjos Viuvo (em 1896) ,regressa á sua Terra Natal por volta de 1912,onde faleceu. Sua filha Maria dos Anjos Adão Leite e seu marido João Moniz Pacheco de Bettencourt,tornam- se os únicos proprietarios da Cerâmica ,no dia 14 de Março de 1914 , após a compra da parte pertencente a Virginia Adão Leite.O casal administrou a Fábrica ,numa época, em que a procura de loiça pelos vendilhões era grande . É curioso que João Moniz Pacheco de Bettencourt chegou a comprar um pequeno prédio rústico pagando-o. com alguidares de barro.
Aconteceu que em 28 de Outubro de 1918, João Moniz Pacheco de Bettencourt não resistiu á doença que grassava na nossa terra, a terrivel gripe espanhola, e sucumbiu nesta data precisamente no dia em que seu filho mais velho Simão faz cinco anos de idade ,deixando ainda mais dois filhos João e Palmira Leite Bettencourt .Maria dos Anjos ,jovem viúva, com tres crianças e uma fabrica de cerãmica para gerir, decide contrair segundas núpcias em 1920 com Manuel da Costa Lima.Este passa a administrar a fábrica de cerâmica, desde então, até 1964, denominada Cerâmica Lima . Assim foi conhecida durante 44 anos por CERÂMICA LINA.

Nesta cerâmica Lima houve muita azáfama . A louça da lagoa é por estas ilhas ,fora,um pouco a porcelana dos pobres. Não há nos Açores lar humilde ,onde ela não preste os melhores serviços e ostente as suas ingénuas decorações.
Além da louça vidrada,produzia tambem e em grande quantidade telha e canos de barro. Por vezes ,telha tipo Marselha, Mosaico e azulejos.
Segundo Manuel da Costa Lima, numa entrevista em 1928, as produções da Fábrica andam por cerca de cem mil peças anuais, muita vez não chegando para atender todos os pedidos. Foi nesta altura que o interesse pela louça doméstica teve tanto incremento que apareceram os “populares vendilhões”da louça da Lagoa.

Netos e filhos de oleiros,os operários da fábrica vivem contentes, modelando o barro com as suas mãos ágeis ,como se tivessem herdado esse segredo.Os processos da fábrica mantem- se, apenas as toscas rodas dos oleiros deixaram de ser movimentadas com o pé para ser pela electricidade. No compartimento de pintura ,alguns operários vão decorando as peças pelo processo de estampilha. Desenhos de grande simplicidade,obedecendo ao mesmo tipo de louça,desde a sua fundação.

Destacaram-se inúmeras familias que trabalharam mais de cinquenta anos,o saudoso oleiro Manuel Correia e Jeremias Ferreira.A familia Ponte Branquinho do qual sete irmãos (António Manuel, João, José, J aime, Francisco e Guilherme) e seus descendentes viveram e trabalharam com o corpo e a alma para esta Cerâmica Lima.

Vivia- se e trabalhava- se com espirito quase de familia entre todos,tendo por hábito o patrão Manuel da Costa Lima oferecer a seus operarios um passeio anual, num camião, volta á ilha de S.Miguel, obrigatoriamente pelo vale das furnas. A não esquecer tambem António Adão e Luis Adão Leite Lima que administravam a fábrica juntamente com o seu pai Manuel da Costa Lima até á data do falecimento de Maria dos Anjos Leite.
Precisamente em Janeiro de 1964 João Leite Bettencourt torna se unico proprietário da industria fundada pr seu avo Manuel Leite Pereira e em sua memória decide dar lhe o nome de “Fábrica de Cerâmica Leite”.

João Leite de Bettencourt era casado com Berta Luz Botelho e Silva Leite de Bettencourt,pai de João Manuel, José Eduardo, Maria Palmira e Rui Jorge da Silva Leite de Bettencourt.Tinha uma formação em Quimica Analista,tendo trabalhado durante quase toda a sua vida na Sinaga (Fábrica do Alcool e do Açucar). A decisão de ficar com a fábrica da sua familia deveu- se principalmente a um forte apego á memória dos seus antepassados.

Então, novo rumo toma esta industria dentro do mais puro estilo artesanal. Novas espécies surgem,mais de quatrocentos tipos, novas cores predominado não só o fabrico tradicional do branco e azul,mas sobretudo, novas cores até á data nao usadas e conhecidas. Novos segredos no fabrico da loiça mais fina e mais clara agradando assim muitos turistas que ocorriam ás Alminhas ao Stand da Fábrica ora em Ponta Delgada no Stand, na Rua dos Mercadores.

É de salientar que João Leite de Bettencourt apenas quiz renovar e enriquecer a qualidade da confeção da fábrica, mantendo, no entanto todos os operários que já trabalhavam á uma vida, (para além dos tão talentosos oleiros e familia Ponte Braquinho ,já citados na Cerâmica Lima acrescento Evaristo Gouveia seu filho Eduardo Gouveia, Fernando Branquinho, Dinis Bulhões e muitos outros…) hábitos,melhorando as instalações para melhor desenvolvimento e bem estar dos operários e continuando a oferecer- lhes moradia no fundo da fábrica tal como no tempo dos seus antecessores.
Foi nesta cerâmica (Lima e Leite) que alguns operários iniciaram o fabrico dos bonecos do presépio, tão apreciados naquela época e sobretudo hoje em dia. Deste modo eles melhoravam o seu rendimento económico e familiar. Destacam se alguns,como Antonio da Ponte Branquinho sucendendo o mais tarde, seu genro Carlos Pacheco, Antonio Morais, Arsénio Moniz e muitos outros . O contato permanente com o barro ,inspirou esses artistas a efectuarem figuras representando cenas da natividade, manifestações religiosas,matança do porco,costumes tradicionais e até lindos castelos, estes já implicavam o uso da roda do oleiro.

A Cerâmica Leite participou na 1 exposição agro-industrial do Concelho de Lagoa,em Outubro 1964, recebendo Mensão Honrosa (1-Premio)
Em 1972 houve grande festejo na Fábrica de Cerãmica a quando do centenário da sua Fundação,envolvendo todos os operários e seus familiares ,amigos, juntamente com seus proprietários .Para comemoração desta tão significativa data foram executadas peças do seu centenário.

Forçado pela grave doença que o acometera João Leite de Bettencourt com muito pesar vendeu sua Cerãmica a 9 de Março de 1973 vésperas do seu falecimento (12 de Março de 1973),acabando neste dia a história duma fábrica de Cerãmica que esteve na familia mais de cem anos ,ao serviço do Concelho da Lagoa,estendendo- se por S.Miguel,restantes ilhas ,continente Português e estrangeiro.Passando por :Cerãmica Açoriana de Manuel Leite Pereira-Cerãmica Lima-e finalmente -Cerâmica Leite.
As instalações de outraora foram posteriormente adquiridas pelo Sr.Antonio José Martins Vieira, proprietário da Cerâmica Vieira.

Da Cerâmica Leite apenas fica a memória de todos que por lá passaram e se dedicaram ao trabalho, desnvolvendo o concelho.

É pois uma referencia histórica e enriquecedora,no Concelho da Lagoa.
Lagoa 11 de Abril 2011
Maria Palmira da Silva Leite Bettencourt